Sobre a caducidade, inexistência de vigência

Sobre a caducidade, inexistência de vigência do Decreto-Lei no 10-A/2020 de 13/3. Tem-me sido questionado porque afirmei no meu último artigo, que o Decreto-Lei no 10 A/2020 de 13/3 já não está em vigor e consequentemente, todas as resoluções do Conselho de Ministros, bem como todos os decretos-lei publicados e promulgados pelo Presidente da República desde o fim do Estado de Emergência em Abril de 2021, incluindo-se agora o Decreto-Lei 30-E/2022 de 21 de Abril, que aboliu o uso das máscaras em alguns espaços, para além de material e organicamente inconstitucionais, assentam num diploma, repito, o Decreto-Lei no 10-A/2020 de 13/3, que já deixou de vigorar, e desde o fim do Estado de Emergência, repito outra vez, em Abril de 2021.. Assim e respondendo, tentando usar uma linguagem o mais simples possível sendo certo que nesta matéria, afigura-se um pouco mais difícil, uma vez que se tratam de conceitos algo técnicos, mas que como sempre o tenho feito, tudo o que afirmo assenta em suporte legal.

 

As Resoluções do Conselho de Ministros que, desde 1 de Maio de 2021 têm servido para impor normas ao abrigo do estado de calamidade, vão buscar a sua legitimidade ao Decreto-Lei n.o 10-A/2020, Diário da República n.o 52/2020, 1o Suplemento, Série I de 2020-03-13.

 

Sucede, todavia, que:

1.Esse Decreto-Lei n.o 10-A/2020 teve de ser ratificado pela Lei da Assembleia da República, Lei n.o 1-A/2020, de 19 de Março, que impôs o primeiro estado de emergência. Não deixo de estranhar e de sublinhar que uma Lei apenas dispõe para o futuro, e nunca retroativamente, como foi o caso desta, que fez retroagir a produção dos seus efeitos, para seis dias atrás!? Apenas a lei penal tem efeitos retroativos, quando descriminaliza ou despenaliza condutas, o que bem se compreende.

 

O Governo não tem competência para poder dispor inovatoriamente em matérias que incidem sobre direitos, liberdades e garantias, em situação de calamidade, como tinha feito através desse Decreto-lei. Assim, à data em que o mesmo foi exarado, padecia de inconstitucionalidade orgânica, por violação do disposto no arto 165 no1 al. b) e arto 19 no1, ambos da CRP.

 

Reparem, tentando simplificar o discurso: O Decreto-Lei no 10-A/2020 de 13/3 decreta o primeiro Estado de Calamidade. A Lei no 1-A/2020 de 18/3 decreta o primeiro Estado de Emergência, ratificando o Decreto-Lei promulgado seis dias antes.

 

2. Terminado o Estado de Emergência, no final de Abril de 2021, tal decreto deixou de vigorar na ordem jurídica portuguesa, não só porque caducou com o termo das leis de emergência que o ratificaram, como porque não pode subsistir autonomamente, por incompetência orgânica do Governo para a sua produção original.

 

3. Assim, todas as Resoluções do Conselho de Ministros que têm vindo a ser publicadas, por lhes faltar qualquer arrimo normativo, padecem de inconstitucionalidade orgânica, mas como também são violadoras de direitos fundamentais, faz-me considera-las também como materialmente inconstitucionais.

 

4. Acresce que, nessas Resoluções, tem vindo o Governo a criar normas inovatórias, o que não se mostra por lei abrangido no âmbito de Resoluções do Conselho de Ministros, mas tão-somente no de decretos lei.

 

5. Os decretos-leis inserem-se na área legislativa do Governo, permitindo-lhe assim impor novas regras; isto é, fazer surgir no ordenamento jurídico, novas normas e conteúdos normativos (embora também possam, estes decretos lei, ter conteúdo regulamentador).

 

6. As resoluções do Conselho de Ministros inserem-se na área administrativa do Governo e destinam-se a regulamentar o que de inovatório foi determinado por lei; isto é, regulam os conteúdos definidos através de Dec. Lei, que se reportam a decisões político normativas primárias.

 

7. No caso, as Resoluções de Conselho de Ministros, porque diplomas de carácter administrativo, não poderiam nem conter normas inovatórias na ordem jurídica diversas das estabelecidas por Dec. Lei que visassem regulamentar nem, no caso, existia sequer, vigente na ordem jurídica, decreto-lei que legitimasse e carecesse de tal regulamentação.

 

8. Estamos pois perante diplomas inconstitucionais (todas as ditas Resoluções), quer por violação do princípio da precedência da lei, decorrente designadamente dos nos 1, 6 e 7 do artigo 112.o, do artigo 199.o, alínea c), e também por violação do artigo 198.o, n.o 1, alínea a), todos da Constituição da República Portuguesa (no que concerne ao uso de Resoluções não para prover à boa execução de leis, mas para criação, inovatória, de deveres e de restrições); quer por inconstitucionalidade orgânica (no que se refere à restrição de direitos, liberdades e garantias, por via governamental, em matéria para a qual a Constituição não lhe confere competência para tal), por violação do disposto nos arto 198 no1 als a) e b) e artos 161 als. c) e d), arto 165 no1 al. b) e arto 200 no1, todos da CRP.

 

CONCLUSÃO: Todos os Decretos-Lei publicados e promulgados desde o fim do Estado de Emergência em Abril de 2021 e que têm como base no Decreto-Lei no 10-A72020 de 13/, para além de serem todos organicamente inconstitucionais, “usam” como suporte um Decreto-Lei que deixou de existir no ordenamento jurídico português, e consequentemente, este novo decreto-Lei, o 30-E/2022 de 21 de Abril, que terminou com o uso de máscaras em alguns locais, e que procedeu à trigésima noma ou quadragésima alteração do art. 13o B, (aquele artigo que estabelece quais os locais em que as máscaras são obrigatórias, para mais fácil compreensão do leitor) têm como base um decreto-lei que desde finais de Abril de 2021, com o fim do Estado de Emergência, deixou de vigorar na nossa ordem jurídica.

CONTACTOS



© 2023 Por Evolution Repair | JPSA Advogados Todos os Direitos Reservados | Política de privacidade